Dois livros que rezam aparentemente sobre o mesmo assunto -a participação brasileira na Segunda Grande Guerra- mas que depois de lidos revelam duas guerras diferentes:a oficial e a real...
“A FEB pelo seu comandante”,Editora IPÊ,1947,343 páginas,tem um autor de peso,o Marechal Mascarenhas de Moraes e explica:Neste livro -que é,certamente,o mais importante documento da história militar brasileira,o Comandante da FEB,com sua autoridade e com o material que pôde dispor,oferece ao país e ao mundo a mais completa,fiel e empolgante narrativa dos feitos dos nossos soldados junto aos seus aliados nos campos da Itália..” Um excelente livro,muito bem documentado,com mapas e croquis,técnico,sem o ufanismo da imprensa oficial mas com uma visão de cima para baixo,longe dos acontecimentos.
“Depoimento de oficiais da reserva sobre a FEB”,mesma editora,lançado dois anos após o acima descrito(1949)com 450 páginas,tem autores de mais peso ainda,os combatentes de frente,homens que enfrentaram o inimigo corpo a corpo e revela a farsa,a burocracia,a incompetência,o descaso e abandono por parte de seus superiores que lhes roubavam a glória:sem ser derrotista,este depoimento de um grupo de oficiais que participaram de nosso corpo expedicionário,revela ao público brasileiro o que se passou por trás dos bastidores deste palco que o ufanismo verde-amarelo armou perante nossos olhos.”
Foram obras publicadas respectivamente dois e quatro anos após o conflito,com o mundo ainda sofrendo suas consequências,mas a mão forte da historia oficial amordaçou o importante depoimento dos oficiais de frente,sustentando até hoje a fantasiosa versão que nos desperta curiosidade quando,ao lermos sobre a Segunda Guerra Mundial em obras inglesas,americanas,alemãs -seus principais protagonistas no teatro onde a FEB atuou- não encontramos nenhuma menção sobre nossas forças e seus feitos,embora lá constem forças menores como os polacos,os indianos,etc... O livro dos oficiais da reserva revela em detalhes todo o despreparo e improvisação,a discriminação existente entre os oficiais do quadro e os da reserva,a saga das nossas enfermeiras abandonadas à sua sorte na Europa e seu curso às pressas,que dava ênfase à ordem unida e aulas de francês,embora fossem atuar junto ao exército americano;o desvio dos presentes,ainda no Brasil,enviados pelos parentes ou doados pela população brasileira aos pracinhas e substituídos por cigarros baratos;as 1000 baixas de Monte Castello que poderiam ter sido bem menores se o alto-comando não insistisse em repetir erros anteriores;a cômica descrição oficial dos feitos heroicos do general Zenóbio na conquista de Camaiore,quando em verdade fora fruto de uma decisão e ação pessoal de um capitão;os problemas resultantes do recrutamento desordenado no Brasil,que levou,logo na chegada à Nápoles,à baixa ao hospital de cerca de 200 pracinhas com sífilis e outras doenças venéreas,além da falta de dentes e até o relato absurdo de um soldado com visível retardo mental,descrito como uma criança grande que não sabia o que lá estava fazendo e que todos procuravam ajudar!
Fica aqui a sugestão à Biblioteca do Exército,que já republicou o livro do General Mascarenhas:uma nova edição do livro dos bravos -e sinceros- oficiais da reserva. Se ajustará bem a esta nova fase politicamente correta de nossas Forças mais ou menos Armadas...