quinta-feira, 21 de abril de 2011

Macaco à moda da casa:o comportamento ecologicamente correto e...a fome!




Deixando as histórias de África para outra ocasião,também aqui no Brasil,na Amazônia,como piloto de helicópteros,garimpeiro ou simples aventureiro curioso já comi praticamente todos os tipos de seres vivos,répteis,anfíbios,rastejantes,galopantes ou repugnantes...Alguns cozidos,outros assados e alguns vivos e esperneantes... É comum nos acampamentos de qualquer atividade na selva o cozinheiro caçar para melhorar o cardápio,geralmente constituído de latas de conserva e carne seca. De fato,proibido ou não,é prática comum e que ajuda muito a moral de trabalhadores em condições difíceis num ambiente hostil. As fotos que acompanham esse texto foram feitas na década de 90,na fronteira Brasil e Peru quando,como piloto de um Bell 206-Jet Ranger III,ajudava na remarcação dos nossos limites territoriais,aferindo os antigos marcos do legendário Marechal Rondon. Nesta ocasião comi um macaco,saboreando o pobre animal e elogiando o cozinheiro pelo tempero com toda a sinceridade,pois recordava-me da última vez que comera tal prato ecologicamente incorreto,na década de 80, nas terras dos Waiãpi,serra do Tumucumaque,na divisa com a Guiana Francesa:

...depois de um dia inteiro em uma lancha voadeira no complicado rio Jacaré,cheio de troncos derrubados em seu curso, dormi na aldeia principal seguindo pela manhã para o escondido e proibido garimpo dos índios,distante dois dias de caminhada no passo dos nativos,uma espécie de corridinha curta seguida de alguns passos normais. Até que rende bem e não é cansativo e eu era bem mais jovem. Assim fomos durante todo o dia sem parada para comer,apenas bebendo rapidamente nos igarapés que cruzávamos. Perto do entardecer paramos e começaram a preparar o acampamento,ou seja,apenas limpar superficialmente um pedaço de chão para a fogueira e pendurar as redes ao redor. Saíram de imediato para buscar alguma comida -eu absolutamente faminto- com seus arcos,flechas e espingardas de chumbo grosso. Outros foram buscar água -sempre acampam perto de riachos- e puseram uma velha lata de 20 litros na fogueira. Em poucos minutos ouvi um tiro e uma grande algazarra na selva,gritos humanos e de macacos. Tive a infeliz ideia de ir até lá...

Os indígenas haviam derrubado um macaco aranha com um tiro que só lhe ferira e se divertiam em arrastá-lo debaixo de pancadas para acabar de matá-lo. O pobre animal,quando puxado pela cauda procurava se agarrar nas raízes e se defendia das pauladas como um humano,com as mãos sobre a cabeça,encolhido,cercado pelos selvagens que usavam apenas uma tanga vermelha,o pirã,que distingue sua tribo. Quando cheguei,o macaco,como se entendesse ver em mim a salvação,olhou diretamente para meus olhos e manteve,com um ar suplicante... Nada poderia fazer naquela situação ou eu é que seria o alvo das pancadas e constrangido desviei o olhar e retornei ao acampamento. Mas a cena triste,cruel,que jamais esqueci não falou mais alto que minha fome. Sentado em minha rede,aguardava o jantar. Partiram o macaco em vários pedaços pequenos sem tirar o couro e os jogaram dentro da lata com a água já fervendo. Muito bom,pensei otimista ao ver a espuma que logo se formou na superfície da água,borbulhando,cheia de sujeira e parasitos do pelo:irão aferventar para desinfetar o bicho e depois tiram o pelo e refogam,já imaginando alguma cebola e óleo surgindo milagrosamente.Mas alguns minutos depois -nem mesmo um salzinho surgira- despejaram a água e sem cerimônias todos começaram a se servir,estava pronto!

Comi,procurando não sentir o cheio nauseabundo,arrancando o espumante couro com a boca e cuspindo,como faziam meus anfitriões. E logo agarrei mais um pedaço,antes que acabasse...